abril 04, 2020

AS COISAS EXCELENTES

E também faço esta oração: que o vosso amor aumente mais e mais em pleno conhecimento e toda a percepção, para aprovardes as coisas excelentes e serdes sinceros e inculpáveis para o Dia de Cristo. Filipenses 1:9,10


Nessa passagem o apóstolo Paulo faz brotar das profundezas de seu coração, cheio de afeto e carinho
Matthew Henry, discorrendo sobre essa passagem das escrituras, em seu clássico comentário bíblico, enfatiza que Paulo menciona a igreja antes dos ministros, porque os ministros são para a igreja, para a edificação e benefício dela, não a igreja para os ministros, para dignidade, domínio e riqueza deles. Ou seja, as igrejas não são propriedade particular de qualquer ministro ou obra cristã, mas tanto a obra quanto o ministério existem no plano econômico de Deus para as assembleias locais, para o seu equipamento, encorajamento e aperfeiçoamento na verdade, em amor.
É importante frisar que Paulo estava “em algemas” quando escreveu aos filipenses, preso provavelmente em Roma, mas sempre exultante no Senhor e na força do Seu poder (1:7, 13), não sendo subjugado pelas circunstâncias e nem limitado em seu amor pelos santos, como ele expressa nessa carta.
Antes, expressando gratidão, alegria e exultação, Paulo ora para que os filipenses “aprovem as coisas que são excelentes”. Mas quais são “as coisas excelentes”? Ao que Paulo se referia quando proferiu esse clamor divinamente inspirado? O que há de tão excelente que nos tornará “sinceros e inculpáveis” no dia de Cristo? Creio que nessa bela e pequena expressão podemos encontrar e sondar o coração desta carta apostólica.
O sentido aqui é não só de aprovar, julgar [distinguir uma coisa da outra, como algumas traduções bíblicas sugerem], as coisas que são excelentes, mas também, e principalmente, de escolher as coisas mais importantes, essenciais, de elevado valor e relevância, em detrimento daquelas que são secundárias ou de pouca importância.
Alguém já disse que o próprio Paulo é o seu melhor intérprete (uma variante do princípio “a Bíblia interpreta a própria Bíblia”). Logo, com base na própria “carta de amor e gratidão” escrita por Paulo aos filipenses, podemos concluir [não de forma exaustiva, obviamente], que são “coisas excelentes”:

pelos filipenses, uma oração em favor de “todos os santos em Cristo” (1:1) que viviam em Filipos, inclusive os bispos [presbíteros] e diáconos.
(I) Nossa cooperação (comunhão) na defesa e confirmação do evangelho (1:5, 7; 4:18): seja financeiramente [como fizeram os filipenses], seja por meio de um “viver digno do evangelho de Cristo” (1:27), ou por meio de anunciar com mais “desassombro a palavra de Deus” (1:14), engradecendo a Cristo em nosso corpo, quer pela vida, quer pela morte (1:20);

(II) Viver de modo digno do evangelho (1:27-30), estando firmes em um só espírito e como uma só alma, lutando pela fé evangélica e participando da graça de sofrer por Cristo, para sermos irrepreensíveis e sinceros, inculpáveis no meio de uma geração pervertida e corrupta (1:10; 2:15);

(III) Pensar a mesma coisa, tendo o mesmo amor, sendo unidos de alma e tendo o mesmo sentimento de uns para com os outros (2:2): buscando viver entrelaçados na comunhão do Espírito Santo, por meio de exortações em Cristo, consolações de amor e profundo afeto uns pelos outros (2:1);

(IV) Nada fazer por partidarismo ou vanglória (2:3), mas tendo em nós o “mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus”, honrando-nos (2:29) e considerando cada um os outros superiores a si mesmo, buscando o benefício e aumento do Corpo, em amor (2:4);

(V) Desenvolver a nossa salvação com temor e tremor (2:12), fazendo tudo sem murmurações nem contendas (2:14), mas preservando a palavra da vida (2:16), por meio da qual poderemos resplandecer como luzeiros no mundo (2:15);

(VI) Receber com toda alegria e honra homens dedicados à obra de Cristo (2:30), como Epafrodito, “cooperador e companheiro de lutas” de Paulo (2:25);

(VII) Acautelar-se dos falsos obreiros (3:2-6), dos falsos mestres, do falso evangelho, antropocêntrico, humanista, focado no bem-estar, enriquecimento e entretenimento dos homens e não no quebrantamento do eu, na confissão dos pecados, na defesa e confirmação do evangelho de Cristo;

(VIII) Considerar tudo como perda por causa da excelência [sublimidade] do conhecimento de Cristo (3:7-11), considerando tudo o mais insignificante diante da majestade, superioridade, beleza e glória do conhecimento pessoal e subjetivo de Cristo, do poder de Sua ressurreição, da comunhão de Seus sofrimentos;

(IX) Esquecer das coisas que para trás ficam e avançar para o alvo da soberana vocação de Deus, em Cristo Jesus (3:12-16), prosseguindo para conquistar, de algum modo alcançar, a ressurreição dentre os mortos (2:11);

(X) Imitar o modelo de Paulo (3:17-21), afastando-se daqueles que são “inimigos da cruz de Cristo”, pessoas que têm o ventre como deus, preocupando-se apenas com as coisas terrenas, focadas apenas no comer, beber, vestir, divertir-se, e não aguardando com expectativa a vinda do Salvador, de uma pátria celestial e superior;

(XI) Pensar concordemente [em unidade e unanimidade] no Senhor (4:2): se o nosso foco estiver na defesa e confirmação do Evangelho, considerarmos tudo como perda e sem valor diante da excelência do conhecimento de Cristo, e estivermos com os olhos nos céus, na iminente volta do Salvador, pensaremos concordemente no Senhor [uma unidade mais escatológica e cristológica do que eclesiológica];

(XII) Alegrar-se sempre no Senhor (3:1; 4:4-7): lançando fora toda ansiedade por meio da oração e súplica, com ações de graças, pois perto está o Senhor! A alegria no Senhor parece ser a grande tônica da carta, o pensamento fundamental que se entende por toda a epístola. Inobstante não haja uma “doutrina sobre a alegria no Senhor” na carta, é evidente que todos os pensamentos de Paulo sobre a igreja dos filipenses são acompanhados de um tom de alegria, ao ponto de que até mesmo as exortações pessoais são introduzidas com o pedido “tornai plena minha alegria” (2:2). A alegria, sem dúvida, é o fio condutor da carta apostólica;

(XIII) Ocupar o pensamento com tudo que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, de boa fama, virtuoso, digno de louvor (4:8-9): uma referência clara a tudo que é positivamente encorajado na carta; e

(XIV) Aprender a viver contente em toda e qualquer situação (4:10-13), confiando sempre Naquele que nos fortalece, por meio do qual podemos lidar alegremente com todas as circunstâncias.
Todas essas “coisas excelentes”, no entanto, possuem como fonte o amor que deve aumentar “mais e mais em pleno conhecimento e toda a percepção”, ou seja, o amor que é o vínculo da perfeição, que nos une ao que é excelente e essencial na vida cristã. Quanto mais plenos em amor, por Cristo e uns pelos outros, mais provaremos a aprovaremos as coisas excelentes e sublimes da vida cristã pessoal e coletiva, mantendo sempre nossa alegria no Senhor, independentemente de nossas “algemas” (circunstâncias).

“Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo: alegrai-vos.” Fp. 4:4.
Em Cristo,


Ercolis Santos

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